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Mistura adúltera de tudo

09/02/2010

O T.S. Eliot tem esse poema genial sobre o que ele fazia na vida: um pouco de tudo. Ele é lá do passado, mas essa coisa de fazer isso/aquilo/aquilo outro é super dos nossos tempos, né?

Mistura adúltera de tudo

Na América, professor;
Na Inglaterra, jornalista;
É a passo largo e com suor
Que a custo hás de seguir-me a pista.
Em Yorkshire, conferencista;
Em Londres, quase banqueiro;
Hás de zombar do meu emprego;
Em Paris, cubro a cabeça
Com o capacete do desprezo.
Na Alemanha, filósofo
Excitadíssimo por Emporheben
No ar livre de Bergsteigleben.
Ando sempre daqui pra lá
Com muita bulha e espalhafato
Desde Damasco até Omaha.
Celebrarei a minha festa
Em um belo oásis na África
Vestido em pele de girafa.

E o meu cenotáfio que fique
Ao sol feroz de Moçambique.

PS: Dica do amigo Robson

Amar

27/01/2010

Bom dia. Essa poesia do Drummond é bonita.

Amar

Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar?
amar e esquecer,
amar e malamar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados, amar?

Que pode, pergunto, o ser amoroso,
sozinho, em rotação universal, senão
rodar também, e amar?
amar o que o mar traz à praia,
e o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,
é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?

Amar solenemente as palmas do deserto,
o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito, o áspero,
um vaso sem flor, um chão de ferro,
e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e uma ave de rapina.

Este o nosso destino: amor sem conta,
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.

Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa
amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita